
Como é que nasce um escritor? Existe um instante inaugural, um despertar narrativo? São estas as questões sobre as quais Eduardo Halfon se debruça em O Anjo Literário, uma colectânea de contos nos quais ficciona episódios da vida de nomes como Herman Hesse, Hemingway e Nabokov.
A primeira vez que li a obra (na edição portuguesa, da Cavalo de Ferro) foi em 2014. Lembro-me de ter ficado deslumbrada com o autor que, quatro anos depois, receberia o Prémio Nacional de Literatura da Guatemala, o maior galardão literário do seu país natal.
No livro, entretanto esgotadíssimo em Portugal1, Halfon constrói uma pesquisa apaixonante sobre o que leva um escritor a dar os primeiros passos, ao mesmo tempo que reflecte sobre o próprio acto de escrever. E faz isso através de uma obra que se esquiva a qualquer tentativa de categorização – um híbrido entre ficção, diário, ensaio e entrevista.
A verdade, contudo, é que o autor não está propriamente à procura do ponto de partida dos outros. O que quer é encontrar o seu: perceber o instante em que também ele se fez escritor, e decidiu largar de vez a engenharia, entregando-se por fim à literatura.
Afinal, quando é que percebemos que queremos escrever? Há um único instante, ou muitos ao longo da vida? Importa assim tanto? Escreveríamos mais ou menos se o soubéssemos? A resposta talvez seja inútil. A pergunta parece-me pertinente.
No que a mim me diz respeito, não consigo identificar o momento exacto em que soube que queria fazer da escrita a minha vida. Quando decidi ser jornalista ainda estava no liceu, mas já me sentia escritora muito antes disso. Escrever era, é-me, intrínseco.
Comecei a esrever ficção na escola primária, aos 12, 13 anos, se não me falha a memória. Nessa altura, transbordava de ideias, todas a competir umas com as outras, mas apesar disso, nunca cheguei a levar nenhuma história a bom porto. Só voltei a pôr em cima da mesa tentar de novo quando a minha filha nasceu.
De repente, sinto um profundo sentido de urgência. E não é que tenha regressado de forma súbita, até dramática, à minha prática de escrita, mas é claro para mim, agora mais do que nunca, que escrever sempre teve muito mais a ver com o processo do que com o destino.
Isto de vos escrever todas as semanas tem ajudado. Não é ficção, e eu sempre achei que estava fadada para ficcionar, mas é um começo. E, se não sou capaz de recordar o instante em que me fiz escritora, escolho este: o momento em que decidi fazer-me escritora.
canto da sereia #21
I
A Ecolivros abriu em Miraflores: a minha camarada Beatriz Magalhães falou com o livreiro Frederico Felicíssimo e fez a reportagem para a Time Out Lisboa.
II
Se gostam de História, o meu amigo Paulo M. Dias — do podcast Falando de História, com Roger Lee de Jesus — juntou-se a João Nisa para nos falar de Aljubarrota. A Batalha que Derrotou os Castelhanos e Mudou o Curso da História de Portugal.
III
Tenho andado a reunir uma lista de livros sobre livros e escrita que gostava de comprar eventualmente, em físico ou digital:
Carta Sobre o Comércio dos Livros de Denis Diderot (Assírio & Alvim, 8,85€);
Linguagem/Tradução/Literatura de Walter Benjamin (Assírio & Alvim, 15,50€);
O Infinito Num Junco de Irene Vallejo (Bertrand, 19,90€);
O Vício dos Livros e O vício dos livros II de Afonso Cruz (Companhia das Letras, 14,98€-17,45€);
Conversas Com Escritores de Isabel Lucas (Companhia das Letras, 18,85€);
Histórias de Livros Perdidos de Giorgio van Straten (Elsinore, 15,49€);
Uma Biblioteca da Literatura Universal de Hermann Hesse (Cavalo de Ferro, 14,99€);
O Zen e a Arte da Escrita de Ray Bradbury (Cavalo de Ferro, 15,45€);
Como Ler Literatura de Terry Eagleton (Edições 70, 20,90€);
ABC da Leitura de Ezra Pound (Maldoror, 16€);
ABC da Crítica de Nuno Júdice (D. Quixote, 12€);
A Arte de Gostar de Ler de Carlos Nuno Granja (Livros Horizonte, 14,90€).
Se gostaste desta edição, partilha-a com quem também a possa apreciar — quanto mais leitores, melhor! E se tiveres sugestões, comentários ou apenas quiseres dizer olá, escreve-me. Gosto de saber que estás desse lado.
Se quiseres apoiar a minha escrita, podes:
Subscrever uma assinatura paga desta newsletter
Enviar-me uns trocos via PayPal
Ajudar-me a destralhar
Infelizmente para mim, que não sei onde anda a minha cópia e queria imenso reler.
Já ouvi dizer que o On Writing do Stephen King também é interessante. Está na minha lista. Mas não sei mais que isso.
A vida, no geral, é mais sobre o processo do que o destino. Texto bonito ☺